"Ajusto-me a mim, não ao mundo." (Anais Nin)
domingo, 3 de agosto de 2008
Cão de guarda
Ela não chegou pra nós filhote, pequena e fofa. Veio grande, maltratada e decepcionada com a vida. Diante da mão estendida pro afago, ela se encolhia e tremia, esperando pelo castigo. Com o tempo ela aprendeu a confiar. Entendeu que era amada. E retribuiu esse amor como eu nunca tinha visto nenhum cão fazer antes. Ela é do tamanho de um bezerro. Mas pensava que era pequena: queria, colo, pulava pra lamber o rosto da gente... E me deixava cheia de roxos e arranhões. É carente, depois que aprende a gostar, lambe o cotovelo de quem está sentado e coloca a cabeça debaixo da mão da qual ela quer o carinho. Ela toma café comigo, vinha pedir o seu pedaço de queijo todos os dias. Não gosta de ração, é preciso disfarçar com um pouco de comida. E é só ver alguém de tênis que ela começa a chorar desesperada pedindo pra sair pra passear. E quando vai, é aquela festa! Ela sai latindo e correndo como se quisesse contar pra todo mundo que está fora de casa.
Durante dez anos ela esteve ao meu lado, me protegendo, me fazendo companhia e cuidando de mim. Há algum tempo, ela começou a mancar. A veterinária disse que poderia ser um tumor ou algo relacionado à idade. Há dois dias ela teve uma fratura patológica: a patinha se quebrou sem nenhuma razão. Fomos ao hospital e lá soubemos que ela tem cancêr nos ossos. O médico me deu a opção de amputar a pata e fazer quimio ou sacrificá-la pois a fratura não tem cura. Eu me recusei a fazer a primeira pois acho que é um sofrimento enorme para uma sobrevida de no máximo um ano. Quanto à segunda opção, pode parecer banal pra muitos, mas eu não consigo me forçar a tomar essa decisão. Sou incapaz de pensar que posso ser responsável por algo dessa monta.
Há dois dias estou tentando fazer a vida dela feliz. Ela fica deitada na caminha, aparentemente sem dor (está fortemente medicada), comendo muito todas as coisas das quais gosta. Eu olho pra ela e, mesmo com a perninha machucada, ela ainda fica feliz em me ver, em comer, em dormir. Abana o rabo, dá aquelas lambidas bem molhadas. Eu queria saber o que ela escolheria pra si. E eu queria que ela soubesse que o que quer que eu faça é por amor, é pela felicidade dela. E mais do que tudo eu queria que, se for a hora dela, que ela se vá sem intervenções e sem dor.
PS: Nesse exato momento ela está latindo de volta pros cachorros da rua como sempre fez. Parece dizer "a casa é minha, estou aqui, tomem cuidado". Sim, ela ainda está aqui...
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2 comentários:
ô menina... sinto muito muito muito mesmo viu... é mesmo uma decisão muito difícil, e mesmo que pareça ilógico, não adianta dizerem pra você que não tem cura, sacrificar ainda é matar e mesmo sabendo que às vezes é a única solução, é difícil de optar por isso. Fico menos aflita de saber que ela está sem dor, pelo menos.
Não disse nada é? É que não tem mesmo o que dizer numa hora dessas. Mas sabe o que eu queria? Queria que todos os bichinhos, quando ficassem assim doentes de coisa que não tem jeito, pudessem dormir e não acordar, sabe? Sem sofrimento pra eles, sem dor, sem agonia... e sem ter que ter a vida interrompida como medida profiláxica. Eles podiam simplesmente dormir. A gente ficaria triste pela saudade né, mas seria uma coisa natural, em paz.
Um beijo menina. @>--
É triste mesmo... mas foi o certo a fazer, a missão dela foi cumprida. Emocionante o texto... e só quem tem cachorro sabe o que eles significam pra gente. Lembre-se que você fez tudo o que podia ser feito, e que ela está sempre com você.
Força... ela está bem melhor agora.
=)
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